domingo, 25 de dezembro de 2011

A Outra


Ver todas aquelas pessoas me deu agonia. Nunca pensei que Luiz fosse tão popular no bairro. O choro corria frouxo ao redor do caixão. Eu não chorava, nem saía do lado dele. A possibilidade da chegada de Maria era uma coisa que me indignava. Ela era a outra, todos sabiam, creio que até a viúva, que àquela altura dormia dopada. Mas ninguém parecia pensar nisso, só eu. Já estava exausto com aquilo. Em silêncio, com os olhos rubros de ódio, eu dizia a ele que acabara com minha vida. Se Maria entrasse por aquela porta a primeira coisa que iria fazer era reivindicar o homem. Eu não suportaria ver. Se tocasse naquele caixão, eu a mataria como quem mata uma galinha. Seria um escândalo, mas eu já não me importava com nada. Minha vida nunca tinha sido discreta mesmo. A minha vida, desde quando o conheci, se transformou num inferno de luzes. Todo mundo falava na rua que o viado da 17 era apaixonado por Luiz e que não fazia força pra esconder a putaria. Eu lembro dos retalhos. Eu lembro das flores multicoloridas que eu pregava, uma a uma, na longa saia e na velha blusinha de sua mulher, as quais me pedia pra que eu vestisse. Eu vestia. Até a calcinha eu vestia, eu não me importava. Eu costurava, remendava as roupas e a dona achava que era pra ela. Se eu fiz alguma coisa pra alguém daquela casa, eu fiz pra Luiz. Foi por ele que eu aprendi a adornar dilacerações.

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